Cientes da importância de uma instituição que aglutinasse os objetivos tão rigidamente visados, deliberou-se a fusão das duas Sociedades marcando para o dia 14 de agosto de 1859, uma reunião Geral, na sede da Sociedade de Beneficência Dezesseis de Setembro com a presença dos sócios.

Deste modo, fundiram-se as duas Sociedades, tornando-se o seguinte Termo:

“Aos quatorze dias do mês de agosto de mil oitocentos e cinqüenta e nove, na sala das sessões da Sociedade de Beneficência Dezesseis de Setembro, compareceram os sócios dela e os da Sociedade Portuguesa de Beneficência, por convite das suas Diretorias e declararam estes, que ficaria definitivamente aceita e aprovada a junção das ex – Sociedade Portuguesa de Beneficência e Dezesseis de Setembro sob o título de “Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro”, única que como tal será reconhecida e respeitada pelos nossos sócios, deixando assim de existir as duas Sociedades anteriores, hoje incorporadas tanto no capital como no pessoal sendo os sócios primitivos os incorporadores da nova Sociedade, sujeitando-se às imposições e as regalias os Estatutos e Regulamentos que se aprovarem. Depois de lido e aprovado este termo perante todos os abaixo assinados fica de fato e de direito incorporada a Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro. Bahia e sala das sessões em 14 de Agôsto de 1859.
Assinados: Joaquim Ricardo Pimentel Batista, Dr. José da Rocha de Miranda Figueiredo, Manoel Ferreira da Silva Couto, Fernando Pereira da Cunha, Cândido Augusto Pires Aguiar, Antônio Joaquim Pereira da Silva, Antônio Joaquim Rodrigues, José Joaquim Gonçalves, Augusto Francisco dos Santos, Guilherme Marinho Galvão, Manoel de Lemos Ribeiro, Antônio Ferreira de Resende”

Existiu uma Mesa Provisória para o período de transição, só depois se elegeu a Mesa definitiva. A mesa da Assembléia Geral ficou assim composta: Presidente Comendador José Agostinho de Salles, Secretários João Luiz Fiúza e Melo e Antônio Joaquim Pereira da Silva.

Os Estatutos foram reformulados no sentido de possibilitar o aumento no número de sócios, pois muitos compatriotas viviam em povoações fora da capital e nas Províncias de Sergipe e Alagoas. Assim, foram abertas agências da Sociedade em Valença, Cachoeira, Santo Amaro, Porto Seguro e Ilhéus nesta Província, na de Alagoas em Maceió, e na de Sergipe em Estância, Propriá, Moroim e Laranjeiras.

Consta nos anais da história desta Sociedade alguns desentendimentos com o Governo local. O Governo queria ter influência sobre a escolha do Presidente da Sociedade. Tal fato implicaria na intromissão do Estado nas decisões da instituição.

Em 17 de outubro de 1862 S. Majestade El – Rei D. Luiz I por solicitação da Diretoria, assinou Alvará declarando-se Protetor da Sociedade. E eleita a nova Diretoria para o exercício de 1862 a 1863, encaminhou solicitação, a Sua Majestade, do Título de Real para a Sociedade, tendo sido conferido por Alvará de 27 de maio de 1863, nos seguintes termos:

“Eu El – Rei forço saber aos que este Meu Alvará virem que, atendendo ao que Me representou a Sociedade Portuguesa da Beneficência Dezesseis de Setembro, estabelecida na cidade da Bahia, no Império do Brasil, da qual Me declarei Protetor por Alvará de dezessete de outubro de 1862 e, Querendo Dar-lhe um novo testamento da consideração em que Tenho o mesmo Estabelecimento pelos salutares fins da sua instituição: Hei por bém e Me praz Anunciando a proposta do Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, conceder faculdade a mencionada associação para usar do título de REAL, podendo por tanto d’ora em diante intitular-se  Real Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro. E, para que assim fique constando autenticamente no archivo da referida Sociedade e possa esta Real Mercê surtir todos os efeitos se passa este Alvará.”
27 de Maio de 1893 (Selo Real)”
El Rei
Anselmo José Braamcamp

Tais proteções e títulos reais mostram claramente a estratégia de aproximação da Sociedade com a sua pátria, tentando assim, diminuir as pressões do Governo da Província da Bahia para influenciar diretamente na Diretoria.

A partir de então, com maior estabilidade política e financeira, as Mesas Diretoras iniciaram diversas ações que ampliaram os serviços que a Real Sociedade prestavam a comunidade, com um conseqüente aumento do patrimônio.

O exercício de 1862-63 foi assinalado pela encomenda ao célebre pintor Resende da cidade do Porto, do retrato a óleo de corpo inteiro de S. Majestade Fidelíssimo El-Rei o Senhor D. Luiz I. Outro fato digno de apreço foi a fundação do Gabinete Português de Leitura, no dia 12 de março de 1863, por iniciativa do Comendador Manoel Joaquim Rodrigues, na sala de sessões da Sociedade Portuguesa de Beneficência. A idéia da criação de uma instituição de caráter cultural tinha o intuito de proporcionar aos jovens vindo de Portugal e aos “portadores de bons costumes” o acesso as letras. Todas as vezes que um navio português chegava no Porto da Bahia as portas do Gabinete eram abertas, para que os marinheiros pudessem acessar a leitura. Tal fato ilustra bem os princípios desta Instituição.

A Sociedade de Beneficência e o Gabinete Português de Leitura realizaram conjuntamente inúmeras atividades culturais e recreativas com a finalidade de arrecadar donativos para as obras assistenciais da Real Sociedade ou para ampliações ou reformas do Hospital Português. Essas atividades eram, em sua maioria, realizadas no Teatro São João, onde hoje situa-se o Palácio dos Esportes.

No exercício 1863-64 a Diretoria, com a finalidade de promover melhores condições para o funcionamento da Real Sociedade, alugou um pavimento inteiro de uma das novas propriedades da Rua das Princesas hoje, Rua Portugal no Bairro Comercial. A Sociedade crescia continuamente. Somente em 1879, a Diretoria resolveu deixar a casa na Rua das Princesas, onde funcionava sua Secretaria, passando a realizar as sessões no Salão Nobre da Associação Comercial.

Neste mesmo exercício foi realizado, no dia 15 de agosto de 1864, uma grande festa de inauguração do retrato do El-Rei D. Luiz I. O 15 de agosto é um dia muito importante para a religiosidade e o patriotismo português. Comemora-se nesta data a vitória de Aljubarrota, de Portugal contra Castela, e o dia de Nossa Senhora da Assunção.

Na festa de inauguração do retrato do El-Rei a Diretoria divulgou a todos a vontade de se criar uma Casa de Saúde ou um Hospital, realizando o tradicional recolhimento de donativos. A primeira iniciativa da Diretoria foi contratar os serviços do Dr. Seixas, dono de uma Casa de Saúde, situada à rua da Ordem Terceira de São Francisco.

Essa etapa da história da Real Sociedade é extremamente relevante, pois a partir daí a assistência hospitalar passou a ser o serviço mais importante oferecido pela Beneficência.
5. FUNDAÇÃO DO HOSPITAL PORTUGUÊS

Por proposta do sócio Gabriel Osório Barros, os membros da Real Sociedade resolveram criar um Hospital. A proposta foi aprovada pela Assembléia Geral e uma comissão foi autorizada pela diretoria para tratar da aquisição de um prédio com proporções convenientes e terreno anexo para obras de ampliação, se necessário, além do mobiliário, utensílios e instrumentos médicos.

Fortemente empenhada na compra de um prédio para um Hospital, a Diretoria deparou-se com um casarão no Alto do Bonfim que pertencia aos herdeiros do Dr. Evaristo Ferreira de Araújo. Em 20 de dezembro de 1864 foi adquirido o prédio, em acerto com a Senhora Thomásia Ferreira de Araújo e seus filhos.

O Engenheiro Civil Ladislau Videck, húngaro de nascimento, a serviço da Província foi encarregado da leitura da planta do Hospital. Aprovada pela Diretoria, logo se tomou as providências necessárias para iniciar a construção, que durou 16 meses.

A inauguração do Hospital Português deu-se em 16 de setembro de 1866 sendo um dos acontecimentos de maior importância do momento. Estiveram presente a cerimônia sua Eminência o Arcebispo D. Manoel Joaquim da Silveira, o Vice-Presidente da Província Dr. Pedro Leão Veloso, o Intendente da Marinha, o Cônsul de Portugal Comendador Augusto Peixoto, o Barão do Rio Vermelho, o Presidente da Câmara Municipal, a Comissão de Representações e toda a colônia portuguesa. Foi celebrada missa solene na Capela, seguindo-se de visita a todas as dependências do Hospital. O Primeiro Médico do Hospital foi o Dr. José Alves Cardoso da Silva, que trabalhou na função durante anos.

As gestões que seguiram trataram do embelezamento e alinhamento da entrada do Hospital. Aberta a praça denominada de “Praça de Bragança” em frente à entrada do Hospital e nivelada a rua, foi oferecida à Municipalidade para uso público, conforme ofício de 7 de janeiro de 1870 assinado pelo seu Presidente Comendador José de Barros Reis.

Continuando o embelezamento do terreno e do edifício do Hospital, a gestão 1871-72, mandou fabricar o gradeamento e o portão principal, com os fabricantes de ferro da Jequitaia. Construiu-se também a muralha de contenção, para evitar deslizamentos e, os jardins laterais.

O prédio do Hospital, situado no centro de uma chácara, com aproximadamente 25 metros de frontispício, de arquitetura elegante e sóbria, circundado por jardins, era um local muito apropriado para cuidar da saúde. Sua distância do centro da cidade era mais um ponto positivo para a concepção de medicina urbana da época. No primeiro pavimento estavam instaladas a Capela, a sala de visitas, uma enfermaria, denominada São José, uma dispensa, a cozinha e sanitários. No segundo andar encontravam-se o salão nobre, com sua galeria dos benfeitores, as enfermarias Santo Antônio e Santa Isabel, além de seis quartos de pensionistas, salão de leitura e instalações sanitárias. Possuía ainda, externamente, quartos para os trabalhadores da casa.

Os sócios desvalidos eram recebidos e tratados gratuitamente, assim como os pensionistas de 1ª e 2ª classes, além dos sócios eram atendidos, também, portugueses e mesmo brasileiros “desprotegidos da sorte”.

O Hospital era dirigido por um médico, que tinha autoridade para chamar outros profissionais para auxiliá-lo quando necessário. Em consultas comuns, o paciente se dirigia ao Hospital onde era atendido prontamente pelo médico responsável. Todavia, se o paciente estivesse impossibilitado de dirigir-se ao consultório, o médico o visitava em sua residência. Havia ainda um serviço de ambulatório, gratuito, que funcionava no Hospital, duas vezes por semana, para os moradores da Freguesia da Penha.

Durante todo o período de funcionamento, o antigo Hospital passou por várias reformas, inspiradas no desejo de melhor capacitar o nosocômio para servir aos seus sócios e a comunidade. Destaca-se a construção de uma sala especial para intervenções cirúrgicas, curativos e aquisição de instrumental cirúrgico, inclusive estufas e esterilizadores raros, na época, em Salvador.

No dia 28 de novembro de 1874 realizou-se a Assembléia Geral, quando os sócios tomaram conhecimento da proposta do Senhor Manuel da Silva Alves Pereira para que fossem admitidos como pacientes no Hospital, na condição de pensionista, qualquer pessoa sem distinção de nacionalidade. Entretanto, a proposta foi recusada, a diferenciação entre portugueses e brasileiros ainda era muito forte neste período.

A partir de 1875, em diversas reuniões da Diretoria, discutia-se a idéia de se instalar uma Casa de Saúde hospital particular, em que os doentes pagam o tratamento, no recinto do Hospital. A idéia foi rejeitada, pois, a mentalidade da época versava que os homens de recursos e seus familiares deveriam ser atendidos em casa; dirigir-se para um estabelecimento de saúde significava rebaixamento.

Em 1880 torna a aparecer a discussão da Casa de Saúde nas Atas de Diretoria. O argumento usado pelos defensores das idéias baseava-se na possibilidade do aumento da receita da instituição, por não existir na cidade outro estabelecimento similar. Mas a idéia foi novamente rejeitada em 1882. De 1883 a 1920 não há menções sobre o assunto, nos documentos da Sociedade.

Destaca-se no ano de 1910 a iniciativa da Diretoria para confeccionar a Bandeira da entidade. Antes desta data, a Real Sociedade usava a Bandeira de Portugal para representá-la. Com a mudança do sistema político de Portugal, de monarquia para república, os sócios da Sociedade se recusaram a astear a bandeira republicana, pois a maioria deles era monarquista.

O processo de discussão da ampliação dos beneficiados com os serviços prestados pela Sociedade só foi retomado em 1921, graças a iniciativa do Professor Fernando Luz de criar um serviço de pensionistas, para não sócios.

Somente em 1925 é que a Diretoria discutiu as modificações necessárias no Estatuto, a fim de possibilitar a criação de tal serviço.

Em 1927, a Diretoria tratou de reformar o Estatuto, devido a criação de uma classe de sócios subscritores, de qualquer nacionalidade, começando por admitir as esposas e os filhos de sócios, aumentando assim, o quadro social da instituição.

Este ato e os grandes serviços prestados à sociedade soteropolitana, fez com que a Real Sociedade fosse reconhecida como de Utilidade Pública, em 24 de maio de 1929, pela Lei n.º 2160. Neste mesmo ano definiu-se a transferência do Hospital para um ponto mais próximo do centro da cidade e iniciaram-se os esforços para a criação de um novo modelo de hospital, que atendessem aos objetivos almejados pela Diretoria, aos novos padrões da medicina moderna e às necessidades da população.

Durante os 65 anos (1866 – 1931) que o Hospital Português sitiou-se no Alto do Bonfim foram atendidas cerca de 2.642 (dois mil seiscentos e quarenta e duas) pessoas e realizados 175 (cento e setenta e cinco) casos cirúrgicos.

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