O modelo de hospital beneficente que foi criado no século XIX, na Bahia, a exemplo do Hospital Português, tem suas raízes na evolução dos estabelecimentos de saúde em Portugal.

Destacam-se três fases evolutivas para a história dos hospitais e instituições de saúde criadas no Brasil. A primeira fase corresponde à criação de estabelecimentos de cariz locais: hospícios, albergarias, gafarias e mercearias. A segunda fase foi a de oficialização, adequação, organização e desenvolvimento dessas instituições. A terceira foi a criação de instituições tipicamente assistencialistas; o Hospital de Óbitos, atualmente Hospital Caldas da Rainha, o Hospital Real de Todos os Santos, a Santa Casa de Misericórdia de Lisboa e o surgimento dos primeiros hospitais nos padrões oitocentistas portugueses.

Os hospícios foram estabelecimentos que primeiramente eram destinados ao assistencialismo às crianças abandonadas. Em Portugal, teve seu início com o Hospital dos Meninos de Lisboa fruto da iniciativa da rainha D. Beatriz, primeira mulher de D. Afonso, em 1458. Tradicionalmente, as crianças rejeitadas eram deixadas nas igrejas e conventos. Mas, após a fundação do Hospital Real de Todos os Santos no ano de 1543, esses menores passaram a ser abrigados no referido estabelecimento beneficente. Depois, esses hospícios para crianças ficaram denominados de reformatórios.

Os asilos também têm sua origem nos hospícios da Idade Média e estavam indissociavelmente ligados a rainha D. Maria I que decretou a 6 de julho de 1853 a criação do Conselho Geral de Beneficência para a criação de medidas relativas a mendicidade. Já os manicômios são frutos das idéias liberais da revolução francesa e da discriminação das doenças mentais.

As albergarias criadas originalmente para assistência dos peregrinos que percorriam O Caminho de Santiago, em particular ao norte do Mondego, serviram também a viajantes, doentes e mendigos. Possuíam algumas enfermarias e seu sustento era proveniente das ordens religiosas e militares.

As gafarias eram destinadas aos internamentos dos gafos ou leprosos. Eram também designadas por leprosarias e, mais tarde, lazarentos, termo que deriva do fato de a lepra ser então igualmente conhecida como o mal de São Lázaro. Algumas gafarias sobreviveram até o século XX o que foi o caso das gafarias para Lázaros e Lázaras, ou melhor, enfermos de chagas incuráveis.

As mercearias foram destinadas originalmente às pessoas da nobreza empobrecida e, em geral, funcionavam junto às capelas. Seu nome é derivado da palavra mercês que significa graças, benefícios, tenças, donativos e favores. A mercearia mais antiga foi fundada por Bartolomeu Joanes, um rico comerciante de Lisboa, em 1342, destinada a pobres. Com a mesma finalidade foi criada outra mercearia por D. Afonso IV, junto a sede de Lisboa.

A Santa Casa de Lisboa, instituída a 15 de agosto de 1498, sob a proteção da Rainha D. Leonor de Lencastre, viúva do Rei D. João II,  foi formada da junção dos 43 pequenos e precários nosocômios presentes na cidade.

No Brasil, a primeira Santa Casa de Misericórdia teve sua origem em Santos no ano de 1543, por iniciativa do português Brás Cubas. Seu objetivo foi criar uma instituição para socorrer os marinheiros enfermos. A segunda Santa Casa do país teve sua sede na capital baiana, no governo de Thomé de Souza. Este imbuído da missão de fundar a cidade do Salvador para sediar o Governo Geral pensou logo na fundação de um estabelecimento assistencial para cuidar da saúde dos homens que compuseram a sua esquadra. Criou-se o Hospital da Santa Casa que teve várias denominações: Hospital de Caridade da Cidade, Hospital Nossa Senhora de Candeias, Hospital Real Militar, Hospital São Cristóvão de Caridade e o atual Hospital Santa Isabel, em Nazaré.

O Hospital São Cristóvão funcionou na rua da Misericórdia desde 1549 a 1833, quando foi transferido para o colégio dos jesuítas e intitulado Hospital Real Militar. Esse estabelecimento deu margem a acontecimentos que transformaram o cenário da capital baiana. A partir dele, foi criada a Escola de Cirurgia, instalada no Hospital Real Militar, por iniciativa de D. João VI, em fevereiro de 1808 dando início a trajetória da vida acadêmica da capital baiana.

A Escola de Cirurgia veio a transformar-se em Academia Médico-Cirúrgica da Bahia, no ano de 1815 à luz da Carta Régia de 29 de dezembro. E por força do decreto de 3 de outubro de 1832, a Academia Médico-Cirúrgica transformou-se em Faculdade de Medicina.

Existiram nesse período diversas sociedades, associações, irmandades e ordens, que imbuíam-se em prestar serviços assistenciais à sociedade. O serviço de assistência aos pobres crescia cada vez mais em face do aumento das populações de Salvador e do Recôncavo. Junto com este crescimento, ascendia o prestígio dos comerciantes portugueses em detrimento dos “senhores do açúcar”.

Alguns nobres portugueses preocupados em prestar um serviço beneficente para a sua comunidade, tiveram a idéia de criar uma sociedade, cuja finalidade principal seria socorrer portugueses necessitados e consequentemente criar uma rede de solidariedade e ajuda mútua entre os patrícios.

No ano de 1857 esses ideais tornaram-se materiais. Dois grupos lusos tomaram a iniciativa, separadamente. Um grupo de comerciantes, em sua maioria, criou a Sociedade de Beneficência Dezesseis de Setembro, em 1º de janeiro. Um segundo grupo, liderado pelo Cônsul de Portugal Comendador José Agostinho de Salles, ligados à atividades mais tradicionais da Província, criou a Sociedade Portuguesa de Beneficência, em 20 de setembro do mesmo ano.

Essas duas Sociedades tiveram pouco tempo de existência, durando aproximadamente dois anos. A breve história da Sociedade de Beneficência Dezesseis de Setembro inicia-se no dia 16 de setembro de 1856, num jantar em comemoração ao aniversário do Rei de Portugal D. Pedro V Monarca Constitucional. A festa tradicional na Colônia portuguesa realizou-se no arrabalde da Vitória, contando com a presença de inúmeros cidadãos de influência social. O Senhor Marcos José dos Santos aproveitando a ocasião descontraída, porém povoada de grande patriotismo, propôs aos cavalheiros ali presentes que criassem uma sociedade de beneficência. A idéia foi recebida com alegria e gerou os impulsos necessários para providenciar a abertura da instituição. Poucos meses depois, a idéia do jantar tornou-se concreta. Em 1º de janeiro de 1857 a Sociedade foi criada. A sessão de fundação foi realizada na casa do Senhor Marcos José dos Santos, situada à Rua Direita do Palácio, hoje Rua Chile. O nome da instituição é uma homenagem ao Rei de Portugal Pedro V e ao momento no qual a idéia foi germinada.

A Sociedade constituiu-se com quarenta e sete signatários, que no dia 30 de março, procederam a eleição da 1ª Diretoria composta por Presidente Marcos José dos Santos; Vice Presidente João Gomes; 1º Secretário Manoel Gomes dos Fernandes; 2º Secretário Joaquim Teixeira Ribeiro e Tesoureiro Joaquim Duarte da Cunha Pinto.

Em 30 de setembro de 1858, foi apresentado à Diretoria o primeiro relatório do ano administrativo e constatou-se um crescimento no número de sócios, de quarenta e sete para cento e cinqüenta e três, bem como do patrimônio da Sociedade.

A Diretoria eleita para o exercício de 1858 e 1859, notando a pouca afluência na entrada de novos sócios em contraste com o número de portugueses residentes nesta cidade, entendeu que os Estatutos não estavam de acordo com os benefícios fins que a Sociedade se propunha e, por isso, convocou uma Assembléia Geral para expor a necessidade da reforma.

Logo percebeu-se que a causa dessa pouca afluência estava na existência de outra sociedade, com o mesmo fim. Como a comunidade portuguesa na Bahia era pequena, se comparada à outras províncias como Rio de Janeiro e São Paulo, as Sociedades acabaram dividindo a colônia e enfraquecendo-se política e financeiramente.

A Sociedade Portuguesa de Beneficência nasceu da proposta de um outro grupo da colônia, liderados pelo Cônsul Salles. Fundada numa reunião em 20 de setembro de 1857, na sala das sessões da Sociedade Monte Pio da Bahia, estabelecida na propriedade do Trapiche Gomes, à rua do Julião n.º 32, onde se reuniram diversos portugueses, aproximadamente quarenta e oito membros.

Aos seis dias de dezembro de 1857 foi discutido e aprovado o Estatuto e no dia 23 de dezembro de 1857 foi realizada a reunião da Assembléia Geral para eleger a 1ª Diretoria da Sociedade Portuguesa de Beneficência, que configurou-se como Presidente Comendador José Agostinho de Salles; Vice-Presidente João Pinto D’Oliveira e Souza; 1º Secretário: Octávio Coelho Messeder; 2º Secretário José Teixeira Gomes. A sede funcionava na casa do seu Presidente. Uma das primeiras ações da Sociedade Portuguesa foi a entrega de donativos para os portugueses flagelados pela epidemia febre amarela.

Diante do impasse que dividia a comunidade, o Sócio – Presidente Marcos José dos Santos submeteu à aprovação da Assembléia Geral a fusão das duas Sociedades. Porém, não logrou êxito essa proposta por estarem os ânimos de alguns sócios exaltados. Alguns meses depois, na sessão de diretoria realizada no dia 14 de julho de 1859, tomou-se conhecimento de um ofício da Diretoria da Sociedade Portuguesa de Beneficência propondo a junção de ambas. Apesar das disputas dos grupos lideres em 1859, chegou-se a um acordo “diplomático” e as duas Diretorias e Assembléias deliberaram uma fusão, assim nasceu a Sociedade Portuguesa de Beneficência Dezesseis de Setembro.

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